A chamada “Indústria 4.0” está mudando a realidade dentro e fora das fábricas. Buscando superar o atraso diante de superpotências como Alemanha, Estados Unidos e Japão – onde a quarta revolução industrial já é uma realidade – o governo brasileiro lançou, neste mês, um pacote de incentivos à modernização do parque fabril brasileiro. O programa tem como objetivo destinar até R$ 8,6 bilhões em financiamentos a empresas e zerar a alíquota de importação de robôs para estimular a inovação.
O assunto foi debatido na Católica de Santa Catarina em Joinville e em Jaraguá do Sul nesta segunda-feira e terça-feira, 26 e 27, durante o workshop “Inovação a caminho do mundo 5.0”. Confira, a seguir, a entrevista concedida pelo professor e palestrante Juliano Reinert sobre o tema, que chama a atenção de estudiosos em todo o mundo.
Católica de Santa Catarina – O que fez países como Alemanha, Japão e Estados Unidos desenvolverem tanto a área tecnológica a ponto de criar uma competição entre eles nesse setor?
Juliano Reinert – O que levou a essa corrida foi a necessidade de resolver problemas que atingissem tanto a indústria quanto a sociedade. Tudo começou na Alemanha. Os alemães queriam o pioneirismo na inovação tecnológica e trabalharam para estar na frente de todos os países neste quesito, criando o conceito de “Indústria 4.0”. Depois de uns dois anos, os Estados Unidos desenvolveram o conceito de “Internet Industrial”. Mais recentemente, o Japão criou um modelo tecnológico chamado “Sociedade 5.0”.
Resumidamente, o objetivo de todos os modelos é trazer mais eficiência para a indústria, produzindo produtos mais inteligentes, customizados e personalizados. Mas o conceito japonês é mais abrangente: utilizar a tecnologia e todos os benefícios que ela traz para resolver problemas sociais, como violência, desastres naturais, aquecimento global, entre outros.
– Quais melhorias sociais o avanço tecnológico já trouxe para esses países?
Juliano – A evolução da tecnologia nesses países está contribuindo para minimizar problemas gerados pela produção em massa. Uma das questões que a indústria inteligente será nossa aliada será na preservação do meio ambiente, por exemplo. Isso porque, enquanto indústria tradicional precisa de grandes estoques para armazenar a matéria-prima e as sobras geram um grande desperdício, a automatização possibilita a produção sob demanda de produtos únicos e personalizados.
A indústria inteligente também está ajudando na inclusão da sociedade. Com a evolução da tecnologia, pessoas com necessidades especiais estão encontrando soluções que a indústria tradicional não oferece, a um custo mais baixo.
Os japoneses estão usando a tecnologia para tentar resolver a questão do envelhecimento da população. Isso é um motivo de preocupação porque, daqui a algumas décadas, o país terá muito mais idosos do que pessoas jovens, e não vai haver trabalhadores suficientes para gerar a riqueza do país. Da mesma forma, eles estão buscando soluções para atrair mais pessoas para o ambiente rural, por causa da superpopulação urbana.
No caso da Alemanha, a Indústria 4.0 está resolvendo o problema da falta de mão de obra operacional. Há três anos, visitei o país e pude ver claramente que havia apenas duas pessoas trabalhando no chão de fábrica de uma grande indústria, pois o sistema que essa empresa adotou era totalmente autônomo e tornava desnecessária a contratação de mais funcionários.
– Quanto tempo deve demorar para que o Brasil chegue ao nível tecnológico dessas grandes potências que já estão vivendo a quarta revolução industrial?
Juliano – Não acredito que o Brasil vivencie essa mudança a curto prazo, pois, atualmente, a realidade que temos na maioria das empresas brasileiras é o 3.0. Penso que essa transição acontecerá a médio prazo, dentro de aproximadamente cinco anos. Além disso, não basta só automatizar as fábricas, também é preciso que os trabalhadores se moldem a esse novo modelo. As pessoas precisam estudar e conhecer novas profissões antes dessa grande evolução acontecer no país.
– Quais lições de casa o Brasil precisa fazer para ser uma nação 4.0?
Juliano – Precisa melhorar muito a infraestrutura, pois a situação das estradas brasileiras dificulta demais o processo produtivo. A internet precisa ser mais estável, mais veloz. Também é preciso investir em educação, em preparar os profissionais para a Indústria 4.0; não adianta a empresa ter uma boa estrutura se as pessoas não sabem como lidar com essa nova realidade.
Também vale dizer que essa mudança precisa ter um propósito. Não adianta a gente simplesmente copiar o modelo adotado em outros países porque os nossos problemas são diferentes dos da Alemanha, do Japão e dos Estados Unidos. Temos de fazer a tecnologia resolver os problemas daqui, como desemprego, alta carga tributária, violência, corrupção.
A tecnologia está aí para fazer com que a gente tenha soluções mais rápidas para os problemas da sociedade, e os sistemas inteligentes vão nos ajudar a fazer mais coisas, melhor e com menos erros. Essa mudança, com certeza, vem para o nosso bem, não para o nosso mal.